Lucas Liberato Lucas Liberato

O que fazer quando a vida te põe contra a parede?

“Se isso for um teste, eu falhei.”

Competir com a vida provavelmente está te custando caro. Essa mentalidade de “vencer” na queda de braço com sua realidade, não é sustentável.

E na tentativa de sermos bem-sucedidos - seja lá o que isso realmente significa - o que estamos deixando de vivenciar?

Para todas as áreas da vida, há pré-requisitos imaginários que estabelecemos, listas de características que esperamos que cada experiência preencha. E a troco de quê? Para quem?

Na última semana, reassistindo a série “Billions” um diálogo me chamou atenção:

"Wendy: O que você faz quando não há mais manobras a serem feitas? Quando independente do que escolher, será um desastre?
Foley: Uma encruzilhada clássica.
W: (Concorda com a cabeça)
F: Há um ensinamento zen, em que o professor segura uma vareta. Ele diz ao estudante: se você me disser que essa vareta é real, eu vou te bater com ela. Se me disser que não é real, vou te bater com ela. Se não disser nada, vou te bater com ela. Então, o estudante estende a mão, pega a vareta e a quebra. Quando a situação é insustentável, você quebra a maldita vareta."
(Billions, temporada 03, episódio 06, "O terceiro Ortolan")

Você já se sentiu colocado contra a parede por sua própria vida? Em uma situação em que as cobranças, externas ou internas, eram insustentáveis, ou que os próprios padrões que vem se repetindo te levaram a um desgaste que não dá pra continuar?

A solução é uma desistência corajosa. Não da vida, é claro. Mas de manter esses padrões que na verdade ninguém nos exigiu diretamente e que não são da conta de ninguém, mas que como um saco de pedras, nós podemos sim, soltar.

Olhar para a vida como ela é, experienciar o que nos acontece em separado de todas as exigências que a bagagem exige, é urgente.

Precisamos quebrar a vareta.

E o que isso significa realmente?

Se continuarmos lidando com a vida com as mesmas regras com que fizemos até aqui, vamos continuar chegando nas mesmas encruzilhadas. Nas mesmas situações insustentáveis, os mesmos dilemas.

Quando o conjunto de regras, quando os padrões que estamos seguindo, nos levam a uma situação insustentável, precisamos mudar a situação.

Gerar, em nós mesmos, uma mudança de perspectiva de 180 graus. Olhar para as situações de um ângulo tão diferente quanto possível.

Uma mudança de ponto de vista é tão efetiva para mudar uma situação quanto um acontecimento novo.

Meu convite para você hoje é: permita-se considerar uma perspectiva radicalmente diferente.

Ao invés de esperar que as circunstâncias mudem, encontrar maneiras de enxergar o que está dado de forma diferente.

Antes de assumir que há um problema com a sua visão, limpe seus óculos. 

Para isso, trago algumas perguntas que podem te ajudar a revisar sua perspectiva atual. Como já de costume, eu recomendo que você as responda por escrito ou gravando áudios, mas não apenas mentalmente. Isso faz toda a diferença.

  • Quais concepções ou crenças estão influenciando minha perspectiva atual?

  • Que informações adicionais eu poderia buscar para obter uma nova perspectiva sobre a situação?

  • Se eu estivesse do lado oposto desta situação, o que eu poderia estar vendo?

  • Se meus erros, fracassos e rejeições fossem feedbacks da vida, que novas possibilidades eles indicariam?

  • Se essa situação fosse exatamente o que é necessário para chegar onde eu quero, como eu lidaria diferente com ela?

Coloque essas respostas no papel, e então tire de lá e ponha em prática. E ao longo da semana, vá me contando por aqui ou pelo Instagram, como está impactando os problemas que você vem enfrentando. Quero ouvir notícias suas.

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Como você se trata em sua mente?

Refletir sobre essa pergunta é surpreendentemente significativo. Tudo o que vivenciamos até agora foi processado e experimentado através de nossa mente, moldado pela forma como nos tratamos internamente. Ao nos olharmos no espelho distraídos, ou enquanto escovamos os dentes, nem percebemos que essa imagem carrega tanto da nossa ideia de nós mesmos. Ao despertar, tomamos consciência de nossa existência e do dia que se desenrola, uma percepção que pode ser reconfortante ou desconfortável, dependendo de nosso estado de espírito.

Pensamos em nossa identidade com base em aspectos como nosso corpo, preferências, histórico, localização e situações em que estamos envolvidos. Um nome, um endereço, um emprego, uma identidade. Pensamentos, emoções, a forma como agimos no mundo. Uma ideia de nós mesmos. Esses elementos compõem quem somos mas somos muito, muito mais que eles. 


Você não é o que você pensa, sente ou faz. 


Tire um momento para deixar essa noção se acomodar.

Essa percepção traz uma abordagem totalmente nova para lidar consigo mesmo. Se você não é seus pensamentos, emoções, e ações então nem tudo o que pensa, sente e faz é uma verdade absoluta sobre sua essência.

Somos nossa mente, um espaço subjetivo que desafia até mesmo as definições científicas. Podemos considerar a mente como a experiência subjetiva dos processos mentais, indo além do resultado da atividade cerebral. Em todos os níveis e contextos em que existimos e nos expressamos no mundo, parte-se da experiência que temos em nossa mente.

Por essa razão, é fundamental direcionar nossa percepção para a maneira como nos tratamos internamente. Pause um momento para deixar de focar na vida externa e em todas as mudanças que desejamos fazer. Olhe para a paisagem de sua mente, onde pensamentos, emoções, sentimentos, memórias e impulsos transitam constantemente. Tudo isso acontece dentro de sua mente, mas a mente vai além deles.

A mente pode ser comparada a um micélio, a rede de filamentos interconectados encontrada nos fungos. Enquanto muitas analogias sobre a mente a igualam a uma central de controle ou a um computador, a imagem do micélio oferece uma perspectiva mais ampla e fascinante.

Nos fungos, o micélio desempenha um papel vital na absorção de nutrientes e na conexão com outras plantas. Ele se estende como uma rede complexa de filamentos, ramificando-se e se entrelaçando, formando uma espécie de "rede subterrânea". Alguns especialistas até se referem a ele como a "internet das plantas". Há evidências que sugerem que o micélio permite a comunicação entre ecossistemas, inclusive transoceânica, facilitando a troca de informações entre diferentes partes do mundo.

Da mesma forma, podemos enxergar a mente como um sistema interconectado de pensamentos, ideias e experiências. Ela forma uma teia de conexões, assim como o micélio, ligando nossas percepções, memórias e emoções. Essa interconexão cria um fluxo contínuo de pensamentos e significados, moldando nossa experiência interna.

No entanto, assim como tudo o que o micélio transporta - nutrientes e informações - não é o micélio em si, a mente também não é tudo o que ela processa. Ela vai além das experiências e dos pensamentos. É importante reconhecer que tudo o que ocorre dentro de nós é apenas uma parte do que somos.

Ali Binazir, médico e filósofo, calculou a probabilidade matemática de nascermos exatamente como somos. Os números são surpreendentes: cerca de 1 em 102,685,000, um 10 seguido de 2,685,000 zeros. Isso nos mostra o quão singular cada um de nós é e como é improvável que uma abordagem única funcione para todos da mesma maneira. Não há solução padronizada ou fórmula mágica que nos transforme instantaneamente em quem imaginamos ser. Tentamos encontrar respostas em métodos rápidos, pacotes completos, crenças e identidades predefinidas. Embora esses elementos sejam importantes, cada um de nós é complexo demais para se adequar a uma única abordagem. Não existe uma única técnica, suplemento, tratamento ou experiência que resolva tudo. Não há um atalho direto para esse destino imaginado. 

O destino é o processo.

Sua mente não é algo a ser resolvido e tirado do caminho. Ela é a sua experiência de existir!

Tudo que você foi, é e será.

Na minha visão, é o propósito da vida: cuidar da relação conosco em nossa mente, pois é ela que molda nossa experiência de vida e é um trabalho em tempo integral. Embora todos os aspectos da vida exijam ajustes, ao focarmos em como nos tratamos internamente, podemos causar um impacto que influencia tudo o mais.

Essa abordagem minimalista e, ao mesmo tempo, profunda, pode ser um ponto de partida poderoso para modificar nossa relação conosco e nossa saúde mental. É a partir dessa perspectiva que podemos começar a reescrever nosso livro de boas práticas, cultivando uma forma mais saudável e compassiva de nos relacionar com nossa própria mente.

É hora de voltar para a prancheta, por assim dizer.

E o que é possível para colocar isso em prática?

Há algum tempo eu venho praticando a escrita introspectiva - chamada de journaling, em inglês - que é uma forma mais elaborada da prática de fazer diários. Tem mais a ver com pensar por escrito que necessariamente registrar nossos dias. 

Começar a escrever quando não se tem o hábito pode ser desafiador e inclusive virar mais uma coisa para procrastinar. No entanto, eu venho incluindo práticas de escrita introspectiva com meus pacientes de terapia e com a orientação certa os resultados têm sido extraordinários. Com entre 15 e 30 minutos de dedicação diária, temos conseguido percepções sobre a relação com a própria mente que tem ajudado a criar mudanças muito importantes e que levariam muito mais tempo por outros meios. Claro que o apoio da terapia em conjunto com a escrita introspectiva fez muita diferença, mas a escrita em si tem sido inestimável no processo.

Você pode praticar a escrita reflexiva a mão, digitando no computador, pelo celular. Pode intercalar a escrita com a gravação de áudios para si mesmo também. Pode escrever todos os dias, várias vezes ao dia, aos poucos ou uma vez na semana. Experimente, teste, encontre o que funciona para você. O formato, a quantidade, até mesmo a preocupação com a “qualidade” ou “o conteúdo” são apenas visitantes inconvenientes que tentam ficar mais tempo na nossa mente do que deveriam. E precisam ser convidados a se retirar como qualquer outro visitante indesejado.

Lembre-se, o que importa na relação com nossa mente é o processo e que este seja gentil, uma experiência que nos dê vontade de continuar.

A princípio, estar presente para nossa mente pode ser uma experiência difícil porque o que não é habitual muitas vezes causa essa percepção. Persista. 

Você vai se agradecer por isso. 

Minha sugestão é, dedique entre 15 e 30 minutos, ao longo desta semana, a "pensar por escrito” suas respostas para as perguntas que sugeri mais abaixo. Em quase todas as situações que nos propomos a escrever, pensamos antes e escrevemos depois. Na escrita introspectiva, é útil fazer diferente: vá escrevendo o que for surgindo na sua mente em resposta ao “prompt”, a pergunta sugerida, como se estivesse pensando na resposta mas fazendo isso por escrito. Você perceberá que isso coloca sua mente num estado alterado de consciência em que você se vê simultaneamente experienciando seus pensamentos e os observando ao mesmo tempo. E reflexões surpreendentes surgem desse processo. 

Essas são as perguntas que sugiro para estimularem sua escrita essa semana:

  • O que você acredita ser verdadeiro sobre a mente humana em geral? 

    • (Dica: Inicialmente, pode ser mais fácil refletir sobre concepções gerais da mente antes de se voltar para a sua própria experiência pessoal.)

  • Quais são os principais desafios mentais que você enfrenta no seu dia a dia? 

    • (Dica: Identificar os desafios pode fornecer insights sobre as áreas em que você deseja aprofundar seu autoconhecimento.)

  • Você já teve momentos em que se sentiu mais consciente de seus pensamentos, emoções e percepções? Se sim, como foi essa experiência? 

    • (Dica: Refletir sobre momentos em que você experimentou uma maior consciência pode ajudar a despertar uma compreensão inicial sobre sua própria mente.)

  • Como você lida com o estresse, a ansiedade ou outras perturbações mentais? 

    • (Dica: Refletir sobre suas estratégias atuais pode levá-lo a uma maior consciência de como você lida com a sua mente.)

  • Quais são as suas percepções sobre a relação entre mente e corpo? 

    • (Dica: Explorar a conexão entre mente e corpo pode ser um caminho para entender melhor a própria mente.)

  • O que eu realmente conheço sobre minha própria mente? 

    • (Dica: Comece a explorar sua própria consciência e reflita sobre como você experimenta pensamentos, emoções e percepções.)

  • Como minha mente influencia minha vida diária? 

    • (Dica: Observe como seus pensamentos e emoções afetam suas ações, relacionamentos e bem-estar geral.)

  • Quais padrões de pensamento negativos ou autocríticos eu noto em minha mente? 

    • (Dica: Identificar pensamentos frequentes e prejudiciais é um primeiro passo para mudá-los.)

  • Quais são os momentos em que minha mente está mais tranquila e em paz? 

    • (Dica: Identificar atividades ou situações que trazem tranquilidade mental pode ajudar a cultivar mais desses momentos.)


Eu quero te agradecer por sua companhia em ler e refletir sobre esse texto e te convido a comentar me contando como ele te impactou e o que você pensou sobre. 

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Crescer nunca para de doer

Acordando de um sono conturbado depois de um episódio de dumping que durou horas, eu me vi espantado com a minha própria humanidade, um momento de vulnerabilidade que me pegou de surpresa.

Mesmo com 3 anos desse processo de mudanças no estilo de vida e no meu peso, a fragilidade ainda é uma surpresa pra mim.

Mas embora eu tenha ganhado uma nova vida, um novo corpo e muitas coisas boas em troca, por vezes ainda me pego lidando com uma fragilidade que continua me pegando quase desprevinido, despreparado para lidar com minha própria humanidade.

Eu me transformei por dentro e por fora

Eu evito falar sobre porque é muito difícil falar sobre as dores que ainda passamos.

Quero mostrar que sentir nunca vai deixar de ser presente. Momentos difíceis não deixam de existir.

E eles significam vida, movimento, continuar é a linguagem da vida.

Eu passei por uma cirurgia bariátrica cerca de dois anos atrás, em que tive meu estômago reduzido a cerca de 150ml de capacidade máxima. Para que você tenha uma ideia, um estômago adulto normalmente pode ser expandir até cerca de 4 litros.

Ainda hoje, me alimento muito menos que seria esperado para um homem do meu tamanho.

A cirurgia me trouxe inúmeros ganhos e eu recomendo muito.

Mas eu tive a má sorte de ser a pessoa mais suscetível do mundo à Síndrome de Dumping.

A chamada Síndrome de Dumping ocorre a quem teve o funcionamento digestivo alterado pela bariátrica, quando os alimentos ricos em açúcar, carboidratos refinados e gorduras (praticamente tudo), passam muito rápido para o intestino.

Os sintomas vão desde enjoos e sudorese, até sensação de desmaio. Se você convive comigo mais frequentemente, já me viu me ausentar repentinamente pra deitar um pouco. Esse um pouco pode ser até o fim do rolê.

Se for um episódio mais forte, eu preciso inclusive dormir.

Por isso, eu acabo postergando comer, já que realmente não dá pra saber o que vai me causar um episódio de dumping que as vezes me deixa nocauteado, me sentindo fraco e indisposto por 2, até 3 horas.

Mesmo alimentos que costumam ser "seguros" às vezes me dão dumping. Posso ter comido mais rápido, sem tanto cuidado ou apenas algo diferente no meu corpo aquele dia e pronto, um dumping inesperado.

É difícil manter uma alimentação saudável com esse problema. E comer pouco afeta minha disposição, que é diretamente proporcional a qualidade da minha alimentação e meu sono. Afeta meu humor, meu senso de bem-estar mesmo.

Quando eu não ligava pra nada disso, até uns anos atrás, eu não conseguia perceber conscientemente o impacto da alimentação, por exemplo, no meu dia-a-dia. Talvez porque eu coma tão menos hoje, e também porque penso tanto nisso, percebo diretamente.

Compartilho isso porque... Não sei bem. Ser vulnerável não acontece naturalmente pra mim.

Eu evito sempre que posso, instintivamente.

Eu tenho me lembrado com frequência de como somos frágeis, de como crescer nunca para de ser difícil e nunca para de doer.

Mas pra mim é importante exercitar isso, compartilhar a verdade que sustenta as coisas que eu falo e faço.

Eu preciso exercitar todos os dias, assim como todo mundo, pensar com mais gentileza e flexibilidade. Quando deixamos solto, a mente se polariza, fica ainda mais difícil olhar pras experiências sem classificá-las como boas x ruins, bonitas x feias, úteis x inúteis, perda de tempo x (já nem sei mais qual é o oposto disso).

Sem colocar uma etiqueta mental em tudo.

Se lembramos de como tudo está sempre passageiro, é menos difícil prestar atenção no presente sem colocar uma etiqueta em cada aspecto dele.

Um dia de cada vez eu sigo.

Um tempo atrás em um dia como esse, eu acharia que tudo está perdido.

Hoje eu olho com doçura pra mim e me abraço.

Olha o quanto você já caminhou, gata.

Olha quanta coragem a senhora tem.

A vida é dura, mas a senhora é macia e hidratada, sempre. Cada dia melhor, o tempo só te valoriza.

Como assim, desistir? Jamais. Sofra hoje, levante amanhã!

A matéria desse corpinho de 1,85m se lembra de explosões cósmicas e surgimento do universo, meu amor.

Nada a temer.

(Sim, eu falo comigo mesmo assim na minha cabeça. )

É se pegar pela mão, se dar um abraço e se ajudar a fazer.

Todos os dias, pra sempre. Sempre vai ser necessário se ajudar.

Me ajuda a ter em mente que qualquer processo tem seus momentos de leveza, alegria e orgulho mas também tem dores, fragilidades e perdas.

Não existe mudança - e nem vida - sem perda.

Eu estou bem e vou ficar cada vez melhor.

Li em algum lugar que uma grande verdade sobre o hoje, é que não importa como tenha sido, nunca mais precisaremos viver esse dia de novo.

Leia de novo.

E lembre!

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BBB, Yasmin Brunet e transtornos alimentares

Vieram me perguntar sobre o que tem acontecido com a Yasmin Brunet e os sintomas de transtorno alimentar que tem aparecido na participação dela no BBB.

Estimular a discussão de temas difíceis no dia-a-dia é um grande ganho do programa.

Sobre transtornos e sofrimento psíquico, imagino que quem está espantado com a forma como ela está sendo tratada e mesmo com a dificuldade que ela tem passado, nunca teve um transtorno que as outras pessoas percebessem... É daí pra pior.

Vieram me perguntar sobre o que tem acontecido com a Yasmin Brunet e os sintomas de transtorno alimentar que tem aparecido na participação dela no BBB.

Estimular a discussão de temas difíceis no dia-a-dia é um grande ganho do programa.

Sobre transtornos e sofrimento psíquico, imagino que quem está espantado com a forma como ela está sendo tratada e mesmo com a dificuldade que ela tem passado, nunca teve um transtorno que as outras pessoas percebessem... É daí pra pior.

Lidar com sofrimento psíquico, é uma realidade bem mais dura do que gostamos de imaginar. Mesmo quando as pessoas de fato buscam ajuda, estão quase sempre querendo uma "cura" com total interrupção dos sintomas. E em saúde mental, nem sempre isso é possível.

Eu sei que as pessoas prometem todo tipo de coisas pela Internet,

mas estou falando do que é real.

E não é necessariamente porque não existam técnicas, ferramentas ou tratamentos.

Mas sim porque mudar os inúmeros diferentes aspectos de um transtorno ou de outra fonte de sofrimento psíquico é Imensamente complexo. Não é como tomar um analgésico pra uma dor de cabeça leve e ter alívio. Também não é questão de não ter uma direção clara sobre o que fazer.

Muitos memes falam sobre alguém querendo que um psicólogo lhes diga o que fazer.

Eu te pergunto:

se teu psi te disser, você vai conseguir colocar em prática?

Para cada problema difícil, as redes sociais estão cheias de soluções fáceis, práticas e... Erradas. "Saber o que fazer" não é nem de longe uma garantia que você vai conseguir por em prática e mais ainda, continuar conseguindo no médio e longo prazo.

Também vale comentar que simplesmente dizer “você tem que ir pra terapia” é uma forma de silenciamento e um desejo de silenciamento. O foco não é na sua melhora, apenas em que você pare de incomodar. É uma forma sutil de violência.

Apoiar a busca de tratamento não precisa ser feito dessa forma.

Por isso o papel do psicólogo vai muito, muito além disso. Não é porque seja algum problema ético em si, te dizer o que fazer. É mais porque isso em si não resolve muita coisa.

Você precisa desenvolver a habilidade de fazer de uma forma que seja compatível com seu jeito de existir.

Um transtorno psíquico não é causado por um vírus, ou uma bactéria ou mesmo um tumor, no geral. Não há um agente causador que podemos medicar e curar. Mesmo quando tomamos remédios, eles atuam nos sintomas ao invés das causas.

Eu não conheço a história da Yasmin, não sei como ela buscou apoio e se cuidou. Desejo a ela e a todas as pessoas que vivem com desafios de saúde mental, que continuem tentando todos os dias e busquem ajuda sempre.

Mas transtornos alimentares podem permanecer presentes de uma forma ou de outra por toda a vida.

Mesmo que a pessoa não manifeste os sintomas mais graves, a compulsão, os medos, a dor emocional, muitas vezes seguem ali por anos e ainda precisam de atenção e cuidado profissional.

O mesmo vale para dependências e de formas diferentes pra quase todas as questões de saúde mental.

Eu sei que é um impulso de sobrevivência acreditar que tem que existir uma vida totalmente sem sintomas.

Mas muito do que chamamos de sintoma, pa são aspectos de quem nós somos. É possível mudá-los? Provavelmente.

Mas vai levar tempo, dar trabalho e é mais fácil com ajuda.

Procure apoio de um(a) psicólogo(a).

E para aqueles que estão sofrendo (e de alguma forma estamos todos) eu digo:

nenhum sofrimento é final.

Vai passar, depois pode voltar e passar de novo.

E não será igual, da próxima vez, e você também não será.

E com o tempo, fica gradualmente menos difícil. E é isso o que, para a maioria, se chama de cura.

A vida é errática.

PS: Também me perguntaram sobre aquele macho desprezível que fez os comentários nojentos sobre ela.

Me recuso a ecoar a voz dos imbecis.

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